Foi a coisa mais bacana a primeira vez que as formigas
conversaram com ele. Foi a que escapuliu da procissão que
conversou: ele estava olhando para ver aonde que ela ia, e aí
ela falou pra ela não contar pro padre que ela tinha escapulido.
– o padre ele já tinha visto que era o formigão da frente, o
maior de todos, andando posudo.
Isso aconteceu numa manhã de muita chuva em que
ele ficara no quentinho das cobertas, com preguiça de se
levantar, virado para o outro canto, observando as formigas
descendo em fila na parede. Tinha um rachado ali perto por
causa da chuva, era de lá que elas saíam, a casa delas.
Toda manhã aquela chuva sem parar, pingando na
lata velha lá de fora no jardim, barulhinho gostoso que ele
ficava ouvindo, enrolado no cobertor, olhando as formigas e
conversando com elas, o quarto meio escuro, tudo escuro de
chuva.
A conversa ficava interessante quando ele lembrava
de perguntar uma porção de coisas, e elas também
perguntavam pra ele. (Conversavam baixinho, para os outros
não escutarem.) Mas às vezes não lembrava nada para
conversarem, e ficava chato, ele acabava dormindo – formiga
tinha hora que era feito gente mesmo.
O bom é que ninguém precisava gritar, nem também
mentir, como as pessoas estavam sempre fazendo. E também
poder ficar olhando assim, sem falar nada, só olhando, sem
precisar falar [...]. Tão bom que nem sabia direito se estava
acordado mesmo ou sonhando, as formigas uma atrás da
outra, descendo, a fila certinha.
Uma tarde entrou no quarto e viu a mancha de
cimento novo na parede, brutal, incompreensível
- Pra quê que o senhor fez isso? Pra quê que o
senhor fez assim com minhas formigas?
O pai não entendia, e o menino chorando, chorando.
Então o pai deu no espalho. Mas a mãe pediu para ele ter
paciência: nesse tempo de chuva as crianças ficam muito
excitadas porque não podem sair à rua e não têm onde
brincar.
De manhã o menino acordava e olhava para a
mancha de cimento na parede. Ficava olhando, até que sentia
um bolo na garganta, e cobria a cabeça com o cobertor.
(Luiz Vilela)
1. Das afirmações seguintes:
I- O texto é um conto narrado em terceira pessoa e tendo,
portanto um narrador observador.
II- Há poucas informações sobre o relacionamento das
personagens, mas há algumas pistas que levam a pensar em
presença constante de diálogo entre pai e filho, ou seja, uma proximidade entre o mundo adulto e o infantil.
III- A rachadura na parede é o detalhe do quarto que favorece
os acontecimentos, pois é de lá que as formigas surgem
levando o menino a construir suas fantasias.
a) Estão corretos os itens I e II.
b) Estão corretos os itens II e III.
c) Todos estão corretos.
d) Apenas I está correto.
e) Estão corretos os itens I e III.
2. Das afirmações seguintes:
I- Os fatos aconteceram numa época de muita chuva quando o
menino ficava dentro do quarto sem ter com que(m) brincar.
II- O conflito do conto está na oposição entre o mundo do
menino e o mundo do pai, entre a fantasia (da criança) e a
realidade (do adulto).
III- O início do quinto parágrafo mostra que o menino tem um
conceito positivo sobre as pessoas adultas que conhece.
a) Apenas os itens II e III estão corretos.
b) Apenas os itens I e III estão corretos.
c) Todos estão corretos.
d) Apenas os itens I e II estão corretos.
e) Apenas o item I está correto.
3. As expressões seguintes marcam a duração do tempo e
dos fatos no texto, EXCETO:
a) Toda manhã
b) Ali perto
c) A primeira vez que
d) Uma tarde
e) Numa manhã de muita chuva
4. Das afirmações seguintes:
I- A partir de uma rachadura na parede, o autor do conto
mostra como a visão de mundo de uma criança pode ser
extremamente semelhante a visão de um adulto.
II- A reação do menino ao ver o conserto da rachadura na
parede mostra que ele considerou tal ato uma violência.
III- A reação da mãe do menino é idêntica a reação do pai.
a) Apenas o item II está correto.
b) Estão corretos os itens I e II.
c) Estão corretos os itens II e III.
d) Todos estão incorretos.
e) Todos estão corretos.
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